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Três em cada 10 brasileiros são analfabetos funcionais

Em Alagoas, segundo membro do Conselho Estadual de Educação, dificuldades são agravadas pela descontinuidade nos estudos

↑ Edna Lopes diz que a perspectiva de redução de gastos do Governo Federal só amplia ainda mais o problema (Foto: Ascom/Sinteal)

Dados do Indicador de Analfabetismo Nacional 2018 apontam que 29% dos brasileiros são classificados como analfabetos funcionais, isto é, foram escolarizados, mas não têm domínio sobre conteúdos elementares e utilizados na dia a dia como interpretação textual ou cálculos simples.

Segundo Edna Lopes, membro do Conselho Estadual de Educação, ainda que tenham sido escolarizados, muitos alagoanos são considerados analfabetos funcionais pela falta de continuidade nos estudos.

“Infelizmente este é um fato constante em Alagoas. A gente tem um número imenso de analfabetos funcionais. É aquele que assina o nome no documento, mas não tem de fato um domínio, um nível de letramento melhor para entender as coisas. Infelizmente isso continua e muito. As próprias condições de oferta da educação, por anos e anos seguidos ofertando currículo ‘banguelo’, vamos dizer assim, sem disciplinas, faltando professores. Na realidade, esse índice reflete isso. A qualidade no ensino pesa, as lacunas que esse aluno chegou à escola e isso não foi superado. Hoje em dia pode pegar um professor universitário e questionar sobre a qualidade de leitura e interpretação dos alunos. São alunos que chegam na Universidade, que conseguem chegar, mas têm dificuldades por conta disso, pelo nível muito baixo”, explica.

A conselheira afirma que além da oferta de vagas é preciso que os estudantes recebam garantias como qualidade de ensino e continuidade para que possam chegar a patamares mais altos. “A oferta é muito importante, porque muitos que não tiveram acesso hoje estão tendo. Abrir as escolas, ofertar vagas, é importante. Mas é preciso mais, é preciso garantir o sucesso desse aluno, condições, melhorar a carreira do professor. Enfim, uma série de fatores que contribuem para esses índices negativos.”

A realidade é ainda mais difícil quando se leva em consideração os mais velhos. Segundo o levantamento, enquanto 12% de jovens entre 15 e 24 anos estão situados na condição de analfabetos funcionais, entre a faixa etária dos 50 a 64 anos a proporção chega a 53%.

“Na Educação de Jovens e Adultos isso se potencializa porque são pessoas que trabalham, que já têm uma vida estabelecida, não têm tempo de se dedicar aos estudos.  O poder público acha que investir em educação é gasto. A perspectiva de redução e gastos do Governo Federal só amplia ainda mais esse problema.  As trajetórias são muito cortadas, ele entrou e saiu muitas vezes e não porque não queria estudar, mas porque as condições não foram propícias, precisou trabalhar, precisou fazer escolhas, a realidade é de sobreviver”, pontua.

O estudo foi elaborado entre os meses de abril e junho deste ano e considera amostra da população entre 15 e 64 anos. Outro dado que chama a atenção é que 25% dos trabalhadores são considerados analfabetos funcionais no Brasil. Entre desempregados ou que buscam o primeiro emprego o número é ainda mais acentuado, segundo o levantamento.

“Maior predominância da população com idade acima de 50 anos entre os níveis inferiores da escala do Inaf: Analfabeto (58%) e Rudimentar (36%) e reduzido percentual de pessoas dessa faixa etária entre os níveis mais altos da escala de proficiência, nível Intermediário (14%) e Proficiente (10%). Em todas as faixas etárias, é significativa a proporção de pessoas no nível Elementar: mais de 3 a cada 10 brasileiros entre 15 e 49, embora funcionalmente alfabetizados, têm significativas limitações para relacionar-se com as demandas cotidianas de uma sociedade letrada”, aponta o estudo.

 

Fonte: Tribuna Independente / Evellyn Pimentel

8º Congresso do Sintufal debate a conjuntura nacional e a crise nas universidades

Evento teve início nesta quarta-feira, 8, e segue até sábado, 11, no Hotel Ouro Branco, na Pajuçara

↑ Congresso teve início nesta quarta, 8, e segue até sábado, 11. Foto: Sandro Lima

O 8º Congresso do Sindicato dos Trabalhadores da Universidade Federal de Alagoas (Sintufal) teve início na manhã desta quarta-feira (7), no auditório do Hotel Ouro Branco, localizado no bairro de Pajuçara. Durante o evento serão discutidos vários temas de interesse da categoria, principalmente “A conjuntura nacional e a reorganização dos trabalhadores” e “A crise das universidades públicas”. O Congresso segue até sábado (11).

“É o nosso oitavo congresso aqui da base estadual e nos próximos quatro dias vamos discutir um pouco mais sobre temas de conjuntura nacional como as opressões ainda vivas nas universidades. O machismo, racismo, homofobia que ainda existem dentro dos campis. No cenário local vamos debater a questão do Hospital Universitário (HU) que hoje vive uma situação de caos. Enfrentamos graves problemas e vamos discutir essas questões”, declarou um dos coordenadores-gerais do Sintufal, Davi Fonseca.

A reitora da Ufal, Valéria Correia, participou da abertura do evento. “Penso que o tema que será debatido no congresso é bastante importante tanto para as universidades quanto para os trabalhadores de uma forma geral. Depois da Reforma Trabalhista, tem sido difícil para os trabalhadores, pois ela flexibiliza e retira muitos direitos. A conjuntura atual é um tema que deve ser bem debatido”, afirmou.

A reitora também destacou os cortes de recursos para as universidades públicas. “A última notícia que tivemos foi sobre o corte das bolsas da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) que tem a previsão de contingenciamento para 2019. Isso significa que a gente não terá pesquisadores com bolsas na universidades”, lamentou.

“É um retrocesso para o país e existe uma pressão muito grande para que isso não seja aprovado. Isso seria um golpe final da pós-graduação das universidades, nas pesquisas, na ciência e a nossa maior preocupação é porque 90% do que é produzido cientificamente no Brasil estão nas universidades públicas”, concluiu.

Nesta quarta-feira a mesa debate “a conjuntura nacional e a reorganização dos trabalhadores”. Na quinta-feira (9) o tema a ser debatido é “a crise nas universidades públicas” e na sexta-feira (10) “a situação dos HUPAA: caos planejado?”. No encerramento, que acontece no sábado (11), será realizada a plenária final e prestação de contas.

As atividades tem início sempre às 8h30.

Fonte: Thayanne Magalhães

Na China, mil anos atrás, as mulheres já jogavam futebol

 

Várias pinturas do século XII mostram quatro mulheres que dão chutes em uma bola colorida. Em 2004, a FIFA concluiu oficialmente que o país asiático é o berço do futebol.

Por Lola Garcia-Ajofrín, do El Pais

  
As arquibancadas vibraram no Rose Bowl da Califórnia durante a final da Copa do Mundo de 1999. Dois gigantes se enfrentaram: os Estados Unidos e a China. Após a segunda prorrogação, o placar continuou com um desesperado 0 a 0, que teve de ser desempatado nos pênaltis. A número 6 dos Estados Unidos concedeu a vitória a sua equipe marcando com o pé esquerdo. Depois do gol, a 6 ria e chorava, tirou a camisa e acenava como um lenço de vaqueiro, se jogou de joelhos na grama e continuou pulando entre os abraços de toda a equipe. A imagem da 6 com um top preto e sem camisa chamou a atenção da imprensa, apesar de muitos outros jogadores terem comemorado suas vitórias com a camisa na mão. Era Brandi Chastain, uma mulher. E essa foi a terceira Copa do Mundo de Futebol Feminino da história. A primeira foi realizada em 1991, na China.

Doze equipes participaram da primeira Copa do Mundo de Futebol Feminino da FIFA, as norte-americanas conquistaram a taça, e já a ergueram três vezes (1991, 1999 e 2015). A Noruega teve sucesso em 1995. A Alemanha em 2003 e 2007 e o Japão, em 2011. A jogadora chinesa Qingxia Shui se contundiu pouco antes do histórico jogo. "Foi algo inesperado, antes da primeira partida, e perdi a oportunidade de participar da Copa do Mundo. É uma tristeza que vou carregar comigo por toda a vida", lembra a chinesa, agora com 51 anos de idade.

Até o ano passado Qingxia Shui era treinadora do Xangai: "O mercado, os torcedores e patrocinadores estão muito mais preocupados, e as condições e o tratamento são muito superiores no futebol masculino, embora tenhamos dedicado uma vida inteira a este esporte". Nascida em Xangai, onde reside, Shui jogou na equipe da cidade e na seleção chinesa entre 1984 e 2001. Fã de Messi, seu maior orgulho é a conquista do vice-campeonato dos Jogos Olímpicos de Atlanta pela equipe chinesa.

Ela é um elo de uma corrente que começou há mil anos na China, de acordo com pinturas que mostram mulheres brincando com uma bola. Várias delas, como a do artista Su Hanchen, do século XII, em que quatro figuras femininas aparecem chutando uma bola colorida, mostram que na China, há um milênio, as mulheres jogavam futebol.

O cuju era um esporte muito semelhante ao futebol, praticado há pelo menos 2.300 anos na China. A primeira referência a ele foi encontrada no século III

Apesar de que na Europa a origem do futebol seja atribuída à Inglaterra, diferentes culturas do planeta, em diferentes épocas, tiveram sua versão de um esporte em que uma bola era tocada com o pé. Os astecas e maias praticavam o jogo há mais de 3.500 anos como um esporte sagrado. O historiador e geógrafo grego Heródoto de Halicarnasso descreve em Histórias que no reino de Lydia (onde hoje ficam as províncias turcas de Izmir e Manisa), em torno do século V a.C, jogava-se bola " para contornar a fome” e "passavam um dia inteiro jogando para não pensar em comer". Em Roma, era praticado o Harpastum com uma pequena bola e grande dose de violência. Também com violência, na Grécia Antiga havia o Episkyros, em que duas equipes rivais competiam pela bola, num esquema mais parecido com o do futebol americano. Há documentos que provam que no Japão, pelo menos desde o século VII, se jogava o Kemari, que consistia em tocar a bola com qualquer parte do corpo exceto braços e mãos, uma modalidade que tinha como referência um esporte chinês, o cuju (tsu 'chu) –– de acordo com a FIFA, essa é a origem do futebol que conhecemos.

O cuju, praticado há pelo menos 2.300 anos na China, era um esporte muito parecido com o futebol. A primeira referência data do século III, explicam na revista do Instituto Confúcio. Era jogado em um campo retangular, com uma trave de gol no centro do campo, que "consistia de uma rede apoiada em varas de bambu", lembra a FIFA. Os participantes tinham de chutar uma bola de pelo recheada de penas para marcar um gol.

Duas equipes com 12 a 16 jogadores se enfrentavam. Havia duas maneiras de jogar cuju: o Zhu Qiu, praticado em eventos da corte para celebrar fatos importantes, como o aniversário do imperador, e o Bai Da, que era semelhante, mas sem um gol, e que durante a dinastia Tang (618). - 907), desfrutava de grande popularidade, especialmente entre as mulheres.

Em 2004, o ex-presidente da FIFA Joseph S. Blatter —que deixou a presidência em meio a um escândalo de corrupção— reconheceu oficialmente que a China é o berço do futebol. Especificamente, a localidade de Linzi, na província de Shandong, conforme publicou em julho daquele ano o jornal China Daily.

O anúncio oficial deveria ter sido feito um ano antes, durante a Copa do Mundo de Futebol Feminino de 2003, que iria ser organizada pela China, mas foi realizada nos Estados Unidos por causa de um surto de SARS (Síndrome Respiratória Aguda Grave). Desde 2015, a cidade chinesa de Linzi abriga o Museu Nacional do Futebol, em que uma placa alerta o visitante: "A confirmação do local original do futebol".

A Copa do Mundo de futebol masculino deste ano acabou e já começa a contagem regressiva para outra, a Copa do Mundo de Futebol Feminino da FIFA 2019, que será realizada pelo atual campeão mundial de futebol masculino: a França. Será entre 7 de junho e 7 de julho, em nove cidades francesas. Entre as 20 primeiras do ranking de seleções femininas da FIFA, encabeçadas pelos EUA, Alemanha e França, quatro são asiáticas: Japão (6), Coreia do Norte (10), Coreia do Sul (15) e China (17). A Espanha está se aproximando das 10 principais, na 12ª posição da lista, com 1911 pontos e a 25 pontos da Coreia do Norte. A veterana jogadora chinesa de futebol Qingxia Shui gostaria que fosse dada “a mesma atenção e recursos nesta Copa do Mundo" que recebem seus colegas das equipes masculinas. 

 Fonte: El Pais

Gustavo Guerreiro: Existe futuro sem Ciência?

 

"Ao que tudo indica, a criminosa interferência internacional já cumpriu seu papel de cooptação interna no Brasil. O corte das bolsas da Capes é somente uma etapa de um processo que representa muito mais do que o abandono de futuros pesquisadores e jovens promessas”.

Por *Gustavo Guerreiro

PORTAL BRASIL
"A dependência científica e tecnológica fere a soberania nacional"."A dependência científica e tecnológica fere a soberania nacional".
Uma crise sem precedentes (ainda maior que a atual) está para se abater neste país combalido desde o golpe de 2016. O Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) referente a 2019, que prevê o corte no orçamento global do MEC para despesas não obrigatórias em cerca de 11%, significará o fim da pesquisa científica básica no Brasil. Segundo o Conselho Superior da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), serão atingidos 200 mil bolsistas em todo país. Trata-se de uma etapa fundamental do projeto de desmonte sistemático do Estado brasileiro, objetivo do consórcio golpista do governo Temer e o PSDB, em sintonia com as teses de subordinação aos ditames do imperialismo. Mas qual é a importância de se investir em pesquisa?

A ciência e a tecnologia são a chave do progresso e desenvolvimento de qualquer nação. As duas áreas desempenham um papel fundamental na criação de riqueza, melhoria da qualidade de vida e crescimento econômico real e transformação em qualquer sociedade. A relação entre Ciência e Tecnologia (C&T) afeta decisivamente diferentes segmentos da vida, como alívio da pobreza, saúde, agricultura, energia acessível, abastecimento de água, gestão ambiental, crescimento econômico, desenvolvimento rural e educação. Na literatura política especializada, a lacuna entre países desenvolvidos e subdesenvolvidos é amplamente atribuída ao nível de domínio tecnológico e à facilidade/dificuldade para sua aplicação.

Em 2017 a então presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC, Helena Nader, durante palestra proferida na Universidade de Brasília (UnB), criticou duramente o corte de quase 50% do governo federal para orçamento da pesquisa científica. Ressaltou o desmonte da política de investimentos, que provoca dependência tecnológica e subordina o país a interesses externos, refletindo na tomada de importantes decisões estratégicas. A dependência científica e tecnológica fere, portanto, a soberania nacional.

Políticas públicas de investimento em pesquisa na área de C&Tsão fundamentais para estimular a demanda por conhecimento no setor privado contribuindo para um ambiente econômico estável, comércio, investimentos, políticas de crédito e de direitos de propriedade intelectual. Essas políticas podem incluir o aprofundamento da tecnologia, aumentar a vinculação entre indústria e universidades e parcerias público-privadas, estabelecer proteção para o conhecimento local e incentivos fiscais para empresas engajadas em pesquisa e desenvolvimento, além de estimular "clusters" de indústrias com base no conhecimento científico e tecnológico adquirido com essas pesquisas. A pesquisa científica é a base para o desenvolvimento.

No caso brasileiro, cerca de 30% das riquezas são geradas graças ao setor agroindustrial, que não se destacaria mundialmente sem o investimento em pesquisa nas áreas de biotecnologia e engenharia genética, especialmente com o protagonismo da Embrapa no âmbito do Sistema Nacional de Pesquisa Agropecuária - SNPA, constituído por instituições públicas federais, estaduais, universidades, empresas privadas e fundações que produzem pesquisas em todo o país em campos do conhecimento científico. Também a Embraer e a Petrobras, duas gigantes da indústria nacional, são fruto de investimento intensivo em pesquisa científica. Também se destaca o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq que, dentre outras iniciativas, foi criado para capacitar o Brasil para o domínio da energia atômica. O domínio do ciclo atômico é tema de importância estratégica. Hoje é relegado pelo consórcio golpista, inclusive com a prisão de um do principal cientista nuclear brasileiro, o almirante Othon Luiz Pinheiro da Silva, pela operação Lava Jato. Foi graças ao almirante Othon que Brasil passou a figurar entre os poucos países que dominam a tecnologia nuclear.

Ainda que precário, não fosse o investimento em pesquisa científica, o país estaria em patamares socioeconômicos ainda piores. Os Estados Unidos, a locomotiva da economia mundial, só conseguiram tal hegemonia mediante fortes investimentos públicos em C&T, principalmente em capital humano. A principal potência mundial se desenvolveu através da encomenda da indústria militar, química e aeroespacial aliada com importantes centros de pesquisa.

Ao que tudo indica, a criminosa interferência internacional já cumpriu seu papel de cooptação interna no Brasil. O corte das bolsas da Capes é somente uma etapa de um processo que representa muito mais do que o abandono de futuros pesquisadores e jovens promessas. Desenha-se, paralelamente, uma gigantesca fuga de cérebros, que resultará na subordinação de pesquisadores periféricos aos centros de pesquisa de países centrais: a chamada integração subordinada. O próprio poder judiciário, grandes conglomerados de mídia e amplas forças da direita reacionária, moralista, antipopular e antinacional, aparentemente desconectados do brutal jogo de interesses que celebra a derrocada do projeto nacional de desenvolvimento soberano e autônomo, assumiram a tarefa de sabotar o desenvolvimento científico nacional e, portanto, o futuro da nação.


*Gustavo Guerreiro é doutorando em Políticas Públicas e pesquisador do Observatório das Nacionalidades


Opiniões aqui expressas não refletem necessariamente as opiniões do site.
Segunda, 30 Julho 2018 19:23

Lampião, morte recontada

Lampião, morte recontada

Tribuna refaz os caminhos do Rei do Cangaço 80 anos após sua morte

↑ Lampião e parte de seu bando foram mortos na Grota do Angico, em Sergipe (Foto: Adailson Calheiros)

No aniversário dos 80 anos da morte de Lampião, o lendário Rei do Cangaço, a Tribuna Independente refez os caminhos percorridos pelo mais famoso cangaceiro brasileiro em sua última semana de vida, numa busca que tenta desvendar os mistérios que ainda cercam as circunstâncias de sua eliminação pela polícia de Alagoas, em terras sergipanas, na manhã de 28 de julho de 1938.

Em busca da verdade histórica, nossa reportagem ouviu pesquisadores, escritores, historiadores, jornalistas, parentes de cangaceiros, de volantes, de coiteiros e de outros personagens que interagiram com Lampião e seu bando nômade durante os 20 anos em que reinou absoluto combatendo, com sucesso, tropas volantes de sete dos nove estados nordestinos.

Neste contexto, procuramos jogar luzes sobre fatos ainda nebulosos daquela quinta-feira fatídica, quando o chefe cangaceiro foi abatido com mais dez membros do seu grupo. As teses sobre o envenenamento do bando pouco antes do tiroteio; a suposta aliança de chefes de volantes com cangaceiros, e a hipotética ação do aspirante Ferreira de Melo como espião do governo para delatar autoridades públicas suspeitas de manter relações comerciais com os bandoleiros são abordadas nesta reportagem especial.

E a maior das teses ocorrerá no seminário “Sertão Cangaço”, que se encerra neste fim de semana, em Piranhas, com a presença de historiadores e estudiosos de todo o país. Trata-se de documentário com depoimentos e imagens inéditas das volantes que participaram do cerco à Gruta de Angico e que pôs fim à vida de Lampião e parte de seu bando. O debate promete dar cabo a algumas das versões que são contadas até hoje. No documento, pesquisadores derrubam a tese de que os cachorros não latiram quando a volante (polícia) chegou, como sustentam outros historiadores. Nele, policiais ouvidos revelam que o cerco foi um “teatro”.

Um dos que defendem essa tese é Jairo Luiz Oliveira, pesquisador e membro da Sociedade Brasileira de Estudos do Cangaço (SBEC), que há 28 anos se debruça sobre a história do cangaço. Ele adiantou ainda à Tribuna Independente, por exemplo, que o comandante da operação em Angicos naquele fatídico 28 de julho de 1938, tenente João Bezerra, faria parte desse ‘teatro’ e cuja versão que se sustentou por esses 80 anos irá cair por terra. “A gente vai pôr fim a um dos grandes mistérios desse cerco e um deles é revelar o mistério de terem fugido do cerco tantos cangaceiros”, completa o pesquisador.

O leitor poderá conferir ainda, com exclusividade, a história da doação de um anel de valor inestimável que foi dado de presente pelo Rei do Cangaço a um amigo e que, esta semana, será doado à Prefeitura de Piranhas, dentro dos eventos de 80 anos da morte do cangaceiro.

Outra revelação que a Tribuna traz à baila, também de forma exclusiva, são bilhetes que teriam sido escritos de próprio punho entre um filho de um coronel do Sertão de Alagoas e Lampião e que estão guardados a sete chaves.

MITO PERSISTE 80 ANOS APÓS SUA MORTE

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(Foto: Benjamin Abrahão / Arquivo)

Manhã de 28 de julho de 1938, Grota do Angico, município de Porto da Folha, Sergipe. Após cinco minutos de fogo serrado, uma patrulha volante do Regimento Policial Militar do Estado de Alagoas (atual PM), comandada pelo 1º tenente João Bezerra da Silva, colocava fim à vida de Lampião, o Rei do Cangaço. Passados 120 anos de seu nascimento e 80 de sua morte, Lampião junta-se a Padre Cícero e Delmiro Gouveia na reduzida galeria dos mitos nordestinos do Século 20. Segundo personagem mais biografado das Américas (perdendo só para o argentino Che Guevara), o temido cangaceiro ainda desperta ódio, admiração e curiosidade entre parentes daqueles que, de alguma forma, ao longo dos anos, tiveram contato com ele.

Na qualidade de mito, sua vida, pontuada de controvérsias, é estudada por pesquisadores que se reúnem periodicamente em inúmeras cidades do Nordeste, onde, por meio de seminários, conferências e palestras, procuram passar a limpo fatos ainda hoje cercados de teorias que se perpetuam através dos tempos.

Seja como for, Lampião é, indiscutivelmente, o maior expoente do cangaço. Dependendo do ponto de vista e da conjuntura, para uns foi bandido cruel e sanguinário. Para outros foi herói e benfeitor. Mas o que todos concordam é que ele era um guerrilheiro astuto, destemido e gestor competente da primeira organização criminosa do Brasil fora do universo político-partidário. Pode-se dizer ainda que ao incorporar nas vestes de seu bando adereços especiais como cinturões e cartucheiras artesanais, lenços coloridos e chapéus com abas viradas enfeitados com estrelas, moedas de ouro, crucifixos e outros símbolos místicos, Lampião inaugurou o “Cangaço Ostentação”.

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Lampião (primeiro sentado da esquerda para a direita) e parte de seu bando de cangaceiros (Foto: Benjamin Abrahão / Arquivo)

Era a terceira vez que Virgulino Ferreira da Silva, natural de Vila Bela (PE), hoje Serra Talhada, acampava com seu bando no Angico. Ali ele se sentia seguro, uma vez que, desde 1928 – quando passou a atuar na área – edificou uma eficiente rede de coiteiros, que monitorava a movimentação policial na região. Além disso, contava com a proteção de poderosos “coronéis” sertanejos, que lhe forneciam munição, remédios, roupas, calçados e dinheiro.

Essa malha protetora, aliada a sua reconhecida competência como combatente, foi fundamental para que o rei dos cangaceiros conseguisse sobreviver por 20 anos à tenaz perseguição das forças policiais. Porém, o inverno de 1938 estava destinado a ser o último de sua vida. Em 10 de novembro de 1937, o presidente Getúlio Vargas dá um golpe de Estado, vira ditador e implanta o “Estado Novo”, regime centralizador e policialesco que pressiona os interventores federais do Nordeste para que o cangaço fosse extinto e os cangaceiros exterminados.

Outro fator determinante para a morte do “Governador do Sertão” foi o documentário “Lampião, o Rei do Cangaço”, produzido, em 1936, por Benjamin Abrahão, mascate libanês e ex-secretário do Padre Cícero. Exibido uma única vez num cinema de Fortaleza, em 1937, o filme provoca a ira do ditador ao mostrar Lampião e seus comandados muito à vontade num acampamento na caatinga alagoana, onde dançam, costuram, cozinham e ainda zombam da polícia simulando tiroteios. Indignado e possesso, Vargas queria saber como um cineasta amador teve acesso tão fácil a um bando cangaceiro perseguido há anos por inúmeros contingentes policiais que diziam ter enormes dificuldades em localizá-lo e liquidá-lo.

O governo manda apreender o filme (do qual restam hoje apenas 14 minutos), e apertar os interventores. Ele exige uma solução imediata para a questão do cangaço. A ordem é repassada aos comandantes gerais das Polícias Militares, que cobram empenho máximo dos chefes de volantes, intensificando a perseguição aos bandoleiros.

JOCA, O JUDAS ENTREGA LAMPIÃO

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Volante alagoana subindo em direção à Grota do Angico, na divisa de Alagoas com Sergipe, em 1938, no fatídico 28 de julho que culminaria com o tiroteio que deu cabo de Lampião e parte de seus cangaceiros (Foto: Arquivo – Autor Desconhecido)

Todo comandante de volante sabia que Lampião, além de estrategista brilhante, audaz e chefe com liderança incontestável sobre seus subordinados, contava ainda com uma tropa “invisível”, formada por pequenos agricultores, vaqueiros, barqueiros, almocreves, comerciantes, padres, policiais corruptos, fazendeiros remediados e poderosos “coronéis”, senhores absolutos de determinadas regiões, onde mandavam na política, na igreja, na Justiça e, claro, na polícia. Além do mais, a partir de 1928, o “capitão” Virgulino dividira o bando em subgrupos itinerantes comandando por “tenentes” de confiança, mas mantidos sob seu comando supremo, dificultando as ações policiais.

Desta forma, ficava quase impossível para a parte honesta dos agentes da lei e da ordem cumprirem suas missões repressivas contra o cangaceirismo. Somente um vacilo absurdo do chefe cangaceiro ou uma traição absolutamente inesperada poderia mudar o jogo em favor dos que caçavam Lampião e seus comandados.

Foi então que no dia 22 de julho de 1938 o imponderável conspirou em favor de Bezerra, chefe da volante estacionada na bela Piranhas, uma lapinha sertaneja engastada entre os morrotes que se debruçam sobre o Velho Chico, 300 quilômetros a noroeste de Maceió.

Pedro de Cândido, coiteiro de confiança de Lampião, foi até Pão de Açúcar na casa de seu compadre Joca Bernardes, coiteiro de Corisco – chefe de subgrupo e o segundo na hierarquia cangaceira – comprar uma grande quantidade de barras de queijo. Mas Joca argumentou que não poderia vender, tendo em vista que o produto já fora encomendado por um freguês.

De tanto insistir, Pedro acabou comprando um lote que dava para alimentar um grande grupo levantando suspeitas de Joca de que os consumidores fossem cangaceiros acoitados nas proximidades.

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Personagem emblemático da história da morte de Lampião, Joca Bernardes ficou conhecido como o coiteiro-delator (Foto: Museu do Sertão / Acervo)

Na véspera, Joca fora avisado pelo cangaceiro Pancada, do grupo de Corisco, que, no dia 21, Lampião atravessara o São Francisco, de Alagoas para Sergipe, estando num coito próximo.

Na noite de terça-feira, 26, Joca vai à delegacia de Piranhas e conta ao sargento Aniceto Rodrigues suas cismas com relação a Pedro de Cândido. “Eu não sei onde está Lampião, mas se vocês imprensarem o Pedro, ele conta”, garantiu Joca a Aniceto.

Reconhecendo a importância da informação, o sargento vai ao posto telegráfico da Estação Ferroviária e manda transmitir ao tenente Bezerra, que realizava diligências na Vila da Pedra (hoje Delmiro Gouveia), o seguinte telegrama: “Venha urgente. Boi no Pasto!” Entendendo o código, Bezerra responde: “Reúna soldados que puder. Venha caminhão encontrar-me meio caminho a fim combinarmos serviço campanha fora vista espectadores. Sigo a pé”.

Há quem diga que o motivo de Joca Bernardes delatar Pedro de Cândido foi a inveja. Segundo nossas pesquisas, o delator não se conformava com a deferência com que seu compadre era tratado por Lampião, enquanto ele, Joca, era desprezado por Corisco.

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Oficiais da PM de Alagoas que combateram o bando de Lampião. Em pé, à esquerda, o tenente-coronel Lucena Maranhão, comandante do Segundo Batalhão (Santana do Ipanema), e o aspirante Ferreira de Melo que matou lampião. Sentado à esquerda, tenente Bezerra, chefe da volante, e, ao seu lado, o coronel Theodureto de Camargo, comandante-geral da PM, em 1938 (Foto: Sociedade do Cangaço de Aracaju / Cortesia)

COMANDANTES PREPARAM O ATAQUE

Antes de deixar a Vila da Pedra, Bezerra consegue, por empréstimo, junto ao sargento Odilon Flor, chefe de uma volante baiana que passava pela região, uma submetralhadora Bergmann modelo 1934. Bezerra disse ao colega baiano que iria a uma fazenda próxima procurar ladrões de cavalo e que logo a arma lhe seria devolvida. Sem desconfiar que uma ação de vulto estivesse em gestação por parte da volante alagoana, Odilon a emprestou sem maiores questionamentos.

Em Piranhas, Aniceto junta doze homens num pequeno caminhão e, na manhã de 27 de julho, parte pelo meio da feira da cidade anunciando aos quatro ventos que iria combater Lampião num lugar distante. Ele tinha certeza de que logo a rede de coiteiros faria com que a informação chegasse aos ouvidos dos cangaceiros, que relaxariam a segurança, fato que acabou ocorrendo.

Operação sigilosa
No início da tarde de 27 de julho, Bezerra, Ferreira de Melo e Aniceto se reúnem no meio da caatinga para montar o plano da emboscada

À força
Coluna policial atravessa o rio arrastando também Durval, de 17 anos, irmão de Pedro, o último a levar encomendas para os cangaceiros na Grota de Angico

No início da tarde de 27, Bezerra, Ferreira de Melo e Aniceto se reúnem no meio da caatinga longe de seus soldados e montam uma operação sigilosa. Composta por 50 homens, a volante entra em Piranhas à noite, embarcando em três canoas amarradas umas as outras como se fosse um só barco. A primeira parada é no povoado de Entre Montes, onde Pedro de Cândido é capturado e torturado, acabando por confessar que Lampião está na Grota do Angico, margem sergipana.

A coluna policial atravessa o rio arrastando também Durval, de 17 anos, irmão de Pedro, que foi o último a levar encomendas para os cangaceiros na Grota. Dividida em três grupos de combate, a volante inicia, por volta das 4h30, a marcha pelos leitos pedregosos dos riachos secos que conduzem ao coito. À frente, sob as miras de suas armas, seguem os irmãos, que guiam a tropa.

REZA E TIROTEIO: CHEGA O FIM DO REI DO CANGAÇO NO SERTÃO

No trajeto, o comandante da volante confere o armamento: uma submetralhadora, duas pistolas automáticas que disparam rajadas, 47 fuzis, punhais e facas. Já Lampião, o chefe do grupo, estava armado com um mosquetão (fuzil curto) belga, pistola (parabelo) e um punhal de 75 centímetros. Seus comandados possuíam fuzis, carabinas, revólveres, pistolas, facas e punhais. Embora tivesse tentado várias vezes, Lampião jamais conseguiu adquirir armas automáticas.

Em meio a uma densa neblina que cobria o Morro das Perdidas, a volante caminha lenta e silenciosa. Só então Bezerra revela aos soldados que logo mais eles iriam topar com Lampião e seus cabras. O clima fica tenso e alguns tomam goles de cachaça misturada com pólvora para dar coragem.

No covil, o chefe cangaceiro acabara de comandar uma reza. Estava em pé com o enorme punhal de bainha de prata atravessado na cartucheira, o mosquetão encostado numa pedra, e o chapéu, enfeitado com três estrelas, pendurado num arbusto.

Cerca de 650 metros após o início da caminhada desde a margem do São Francisco, a vanguarda do Aspirante Ferreira dá de cara com o cangaceiro Amoroso, que fora a um caldeirão buscar água empoçada para fazer café. Surpreso e nervoso, o soldado Abdon abre fogo, mas erra, e o bandido foge. Com o susto, Lampião vira-se de frente para a volante e recebe um tiro certeiro reivindicado pelo soldado Honorato (Noratinho); a bala vara sua cartucheira de couro, acerta o punhal, resvala e lhe atinge o baixo ventre. O capitão tomba.

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Uma das visões que os soldados da volante tiveram para trucidar parte do bando de Lampião na Grota de Angico (Foto: Adailson Calheiros)

Maria Bonita recebe um tiro na barriga, vira-se e tenta correr, mas é atingida por um segundo disparo nas costas, caindo ao lado de Virgulino. Em seguida, o soldado Panta de Godoy, o mesmo que baleara Maria, atira na cabeça de Lampião já caído, enquanto outros soldados desferem coronhadas na cabeça do líder cangaceiro, quebrando-lhe o nariz e a mandíbula.

Simultaneamente, o grupo de Bezerra dispara contra a turma de Zé Sereno, arranchado a trinta metros de Lampião. Surpreendidos (muitos ainda dormiam), cinco caem fulminados. Quatro são mortos na fuga, e dois são feridos, mas escapam durante a rápida troca de tiros. Um soldado (Adrião) morre. Os cangaceiros abatidos são decapitados e os valores que carregavam, como dinheiro, joias de ouro, prata e pedras preciosas – produtos dos roubos ocorridos durante vinte anos de atuação criminosa – são apreendidos pela volante.

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Pesquisador Jairo Oliveira explica na Grota de Angico detalhes do tiroteio que ocorreu há 80 anos (Foto: Adailson Calheiros)

Não há como saber se o tiro dado na cabeça de Lampião por Panta de Godoy foi o que lhe causou a morte, ou se ele morreu quando recebeu o primeiro disparo. Já Maria Bonita teria sido degolada ainda viva pelo soldado Sebastião Vieira Sandes, chamado de Santo pelos colegas. Como o grupo de combate do sargento Aniceto não consegue fechar o cerco, 23 cangaceiros escapam.

MORTOS E SOBREVIVENTES

Além de Lampião e Maria Bonita, morreram em Angico, atingidos por tiros de fuzil, os cangaceiros Luiz Pedro, Enedina, Quinta-Feira e Marcela (homem). Por balas de armas automáticas tombaram: Elétrico, Moeda, Mergulhão, Alecrim e Colchete. Entre os vinte e três bandoleiros que escaparam de Angico estava José (jovem de 17 anos, sobrinho de Lampião, filho de Virtuosa), que entrara no cangaço apenas três dias antes do tiroteio que pôs fim à vida do tio famoso.

O CORTEJO MACABRO

Abatido com parte de seu grupo, Lampião e seus comparsas de crime tiveram suas cabeças decepadas e expostas na escadaria da Prefeitura de Piranhas, juntamente com armas, cartucheiras, chapéus, bornais, cobertas, lenços e até uma máquina de costura. Logo em seguida, numa procissão macabra, os crânios foram exibidos como troféus de guerra em praças públicas nos municípios de Santana do Ipanema, Vila da Pedra, Palmeira dos Índios, Limoeiro de Anadia e Maceió.

Na capital alagoana, o cortejo das cabeças seguiu de Bebedouro até a Praça da Cadeia, acompanhada por uma multidão em delírio. Da sacada do Quartel Geral do RPM foram novamente mostradas à multidão que lotava as cercanias. Em seguida, as de Lampião e Maria Bonita são entregues ao legista José Lajes Filho, da Santa Casa, onde, depois de embalsamadas, seguiram para o Instituto Nina Rodrigues, em Salvador, ficando em exposição pública durante 30 anos.

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Corpo do Rei do Cangaço caído, fuzilado pela polícia na Grota do Angico, já sem cabeça (Foto: Arquivo)

Só em 1969 a família Ferreira ganhou na Justiça o direito de sepultá-las. No ano de 2002, ambas foram transladadas de Salvador para Aracaju, estando hoje em local que seus descendentes não revelam. As cabeças dos outros nove integrantes do bando foram enterradas ainda nos primeiros dias de agosto de 1938, no cemitério São José, no bairro do Trapiche da Barra, em Maceió.

Dos 34 bandidos arranchados no coito (esconderijo) sergipano no dia do ataque, onze morreram e 23 escaparam atirando contra a volante durante a desesperada fuga em meio à caatinga espinhenta e pedregosa. No rápido confronto, o soldado Adriano Pedro de Souza, conhecido como Adrião, foi o único policial morto. Bezerra, com uma bala no quadril, e o soldado Guilherme da Silva, com um braço quebrado por tiro, foram as outras duas baixas da tropa vitoriosa.

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Registro do casal mais famoso da caatinga nordestina (Foto: Benjamin Abrahão / Arquivo)

Após serem saqueados, os corpos dos cangaceiros permaneceram insepultos na Grota do Angico por 10 ou 12 dias, sendo devorados por urubus e outros animais. Depois disso, os despojos ressequidos foram cobertos por cascalho. Ao longo do tempo, as ossadas foram levadas pelas águas pluviais através dos riachos que desaguam no São Francisco durante os raros invernos chuvosos do Sertão.

LAMPIÃO QUERIA SE APOSENTAR?

De acordo com o depoimento do cangaceiro Candeeiro que, juntamente com Balão, escapou ferido, o objetivo de Lampião em estar acoitado naquela grota de uma única saída e chamada de “cova de defunto” por Corisco, era realizar uma reunião entre os subgrupos para comunicar sua saída do cangaço. Lampião, com 40 anos de idade, vinte de lutas com a polícia, cego do olho direito, manco por causa de um tiro no calcanhar, cansado de tanta perseguição e pressionado por Maria Bonita a abandonar aquela vida, teria dito a ele que queria se mudar para Minas Gerais, onde pretendia comprar uma fazenda em que pudesse criar em paz sua filha Expedida, então com seis anos.

Mas os grupos de Corisco, Ângelo Roque (Labareda) e Canário não chegaram a tempo para a grande reunião que deveria decidir o futuro do chefe, passando, se fosse o caso, o comando do bando a outro companheiro, provavelmente Corisco. Mas a ex-cangaceira Sila (1919 -2005) sempre contestou Candeeiro, dizendo que Lampião jamais abordaria um assunto de tamanha importância com um cangaceiro recruta como era o caso dele, na época. ”Se Lampião estivesse pensando em abandonar o cangaço, jamais teria trazido seu sobrinho José para entrar no grupo naquela semana”, argumentava Sila.

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Parte da volante que emboscou os cangaceiros ao observar o corpo de Maria Bonita (Foto: Arquivo)

O certo é que oito décadas após sua morte, Lampião continua sendo uma lenda nordestina que influencia a literatura, o cinema, o rádio, a televisão, o teatro, as artes plásticas, a música, a dança, a moda e a culinária. Dos seus companheiros de jornada, só a ex-cangaceira Dulce, de 95 anos, ainda vive. Reside em Campinas (SP) e era companheira do bandoleiro Criança. O casal escapou do ataque em Angico sem ferimentos, entregando-se à polícia. Tempos mais tarde, ambos foram residir em São Paulo na mesma época em que migraram Sila, Zé Sereno, Balão e outros sobreviventes.

Com a morte de Lampião, Corisco (alagoano de Água Branca) e seu grupo de oito bandoleiros tenta prosseguir no cangaço. Mas com os dois braços paralisados por tiros que lhe acertaram num combate em Sergipe, em 1939, ele e sua companheira Dadá deixam a vida cangaceira e viajam para Goiás, onde pretendiam começar vida nova. Porém, em 25 de maio de 1940, o casal é descoberto pela volante baiana do tenente Zé Rufino, que mata Corisco e captura Dadá, pondo fim definitivo ao cangaço.

LINHA DO TEMPO

Quem foi Lampião?

Nascimento – Quarto filho de José Ferreira da Silva e Maria Lopes da Silva, pequenos sitiantes sertanejos, Virgulino Ferreira da Silva nasceu em 4 de junho de 1898 no sítio Passagens das Pedras, município de Vila Bela, PE, (hoje Serra Talhada). Teve quatro irmãos e quatros irmãs.

Infância – Virgulino estudou apenas por três meses. Lia e escrevia razoavelmente, sendo que sua caligrafia era elogiada. Apaixonado pela vida sertaneja, lidava com a terra e cuidava das criações e nas horas vagas nadava nos riachos da região e brincava de guerra com os irmãos e os meninos vizinhos atirando bolas de barro com bodoques.

Artista – Foi um hábil artesão em couro, compositor e almocreve – comerciante que transporta mercadorias nos lombos de burros – que rasgou os sertões trabalhando, inclusive, para Delmiro Gouveia, então o maior empresário nordestino.

Revolta – Em 1916, um roubo de cabras cometido por um empregado da fazenda do vizinho e amigo Zé Saturnino, muda a trajetória de sua vida. Ao queixar-se ao patrão do larápio, revolta-se ao não obter a atenção esperada e fica inconformado com a Justiça pela falta de punição ao ladrão. Daí começa uma série de atritos, que terminam em mortos e feridos.

Entrada no Cangaço – Em 1918, Virgulino e seus irmãos Antônio e Livino, juntam-se à família Porcino, composta de cangaceiros. Ele queria reforçar seu grupo com a finalidade de combater Zé Saturnino e os aliados dele que ainda os perseguiam. Nessa época, os Ferreira cometem seus primeiros assaltos.

Mudança para Alagoas – Pacífico e avesso à violência, José Ferreira, pai de Virgulino, muda-se, em 1920, para Água Branca, em Alagoas e, posteriormente, para o povoado de Santa Cruz do Deserto, município de Mata Grande, onde sua esposa, Maria, morre de infarto logo na chegada.

A morte do pai – Em 26 de julho daquele ano, uma volante comandada pelo então sargento Lucena Maranhão, da PM de Alagoas, invade a casa de um suspeito de roubo, entra atirando e mata três pessoas que não ofereceram resistência. Um deles era José Ferreira, que apenas descansava e não tinha ligações com o procurado da polícia.

Cangaceiro profissional – Assim que soube do assassinato do pai, Virgulino vai ao local, entrega suas irmãs e o jovem Ezequiel aos cuidados de João, seu irmão de 18 anos, e avisa que daquela data em diante iria matar até morrer. A partir daí ele dá início oficial à sua vida de cangaceiro assumido.

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O apelido Lampião – Ainda em 1920, ele e seus irmãos deixam o bando dos Porcino e entram no grupo de Sinhô Pereira, outro cangaceiro. No ano seguinte, ganha o apelido de Lampião pela rapidez com que atirava com sua carabina que, segundo dizem, parecia um lampião por causa das chamas que produzia clareando a noite.

Chefe de bando – Em 1922, Sinhô Pereira abandona o cangaço e entrega o comando a Lampião. No dia 26 de julho daquele ano, ele invade a cidade de Água Branca (AL) e rouba joias e dinheiro da mansão de Joana Vieira Sandes de Siqueira Torres, a octogenária baronesa de Água Branca. É sua primeira ação como chefe cangaceiro.

Vida bandida – Este assalto faz com que a imprensa volte sua atenção a Lampião, que inicia uma série de assassinatos, sequestros, extorsões, mutilações, castrações, invasão de vilarejos, arruados, fazendas e casas comerciais, travando ainda combates ferozes contra tropas da polícia.

Coluna Prestes – Em 1926, sua fama de combatente arrojado e destemido faz com que Padre Cícero, líder religioso baseado em Juazeiro (CE), atenda ao pedido do deputado Floro Bartolomeu convocando Lampião e seu bando para integrarem a Brigada Patriótica, uma milícia composta por cangaceiros para combater a Coluna Prestes, tropa revolucionária itinerante que tinha por objetivo depor Artur Bernardes, presidente da República à época.

Capitão – Armado com 50 fuzis novos e muita munição, Lampião recebe a patente de capitão. Mas quando inicia a perseguição à Coluna fica sabendo que sua patente não era aceita pelos chefes de polícia. Raivoso, ele volta às suas atividades cangaceiras, deixando a Coluna comandada por Luiz Carlos Prestes, um capitão de verdade, seguir seu caminho.

Enxotado – Em 1927, à frente de mais de 100 homens, o Rei do Cangaço tenta invadir Mossoró (RN), mas é enxotado pela população em armas. Na fuga, o bando se desarticula. Em agosto do ano seguinte, com apenas seis homens, Lampião atravessa o Rio São Francisco, de Pernambuco para a Bahia, e passa a atuar nestes estados e mais Sergipe e Alagoas, já com sua tropa dividida em subgrupos para dificultar a ação das volantes.

Sanguinário – Na semana do Natal de 1929, o bando invade Queimadas, na Bahia, saqueia o comércio, promove um baile e mata, a sangue frio, a golpes de punhal, sete soldados que estavam descontraídos na delegacia. O crime bárbaro revolta a região e os chefes de volante apertam o cerco aos bandoleiros. As autoridades baianas oferecem uma recompensa de 50 contos de réis (650 mil reais hoje) a quem pegasse Lampião vivo ou morto.

Maria Bonita – Em 1930, Virgulino se casa com a baiana Maria Gomes de Oliveira, que ficaria conhecida como Maria Bonita, primeira mulher a ingressar no bando. Isso abre as portas do cangaço para outras 41 mulheres, levadas pelos seus respectivos companheiros. Desse período até 1938, quando foi morto, Lampião continuou sua vida de crimes, desafiando as forças policiais. Seus irmãos Antônio, Livino, Ezequiel e mais o cunhado Virgínio também morreram em combates ao longo da jornada pelos sertões.

SESSÃO ESPÍRITA E ANEL NO MUSEU

Fruto de uma dubiedade que se apresentou na personalidade de Lampião durante a vida — ora como homem acusado de ser violento, cruel e vingador, ora extremamente introspectivo e respeitador com as coisas além-Terra, do céu — a religiosidade foi, sem dúvidas, uma das marcas do Rei do Cangaço.

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Anel que pertencia a Lampião dado de presente a amigo e que será doado ao Museu de Piranhas (Foto: Adailson Calheiros)

Prova disso foi a revelação feita por Antônio Capistrano e que a Tribuna Independente teve acesso, recentemente. Filho de um grande amigo e contemporâneo de Lampião, o pai de Capistrano recebera de presente das mãos do cangaceiro uma inestimável lembrança: um anel com um crucifixo com uma figura de Jesus Cristo e que reforça o apreço de Lampião pela religiosidade.

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Oliveira mostra relíquia protegida a sete chaves (Foto: Adailson Calheiros)

Após a morte de seu pai, Capistrano guardou por muitas décadas o anel de 14 quilates usado por Lampião em muitas batalhas na caatinga e transformou o metal em segredo e relíquia.

Espírita, Capistrano decidiu, recentemente, doar a relíquia do Rei do Cangaço, após participar de uma sessão na qual foi aconselhado pela “espiritualidade” a se desfazer do objeto histórico e doá-lo a algum museu para que a história seja contada. “É uma história mística, interessante. O Capistrano chegou aqui muito emocionado, acompanhado de toda família e chorou muito. Disse que o anel não lhe pertencia mais e que iria doá-lo para que o público pudesse compartilhar da história deste objeto”, contou Jairo Oliveira, que, além de pesquisador do cangaço, é também o secretário de Cultura e Turismo de Piranhas.

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Secretário Fábio diz que Piranhas é hoje tem um dos maiores acervos da história do cangaço no Brasil (Foto: Adailson Calheiros)

O objeto será doado ao Museu do Cangaço, em Piranhas. “Estamos providenciando um esquema de segurança para evitar surpresas desagradáveis porque é, sem dúvidas, mais uma relíquia na história do cangaço que só agora foi revelada. E bom é que ficará em Piranhas, que hoje tem um dos maiores acervos do cangaço no país”, explica o secretário de Cultura e Turismo de Piranhas, Fábio Henrique de Lima.

BILHETES AMEAÇADORES DO CAPITÃO PARA UM MAJOR

Com exclusividade, a Tribuna Independente teve acesso também a bilhetes originais escritos de próprio punho pelo capitão Virgulino Ferreira, o Lampião, endereçados a uma importante personalidade do Estado na década de 1920. As cartas estão em posse de Flora Amália de Albuquerque Amaral, professora aposentada de História, nora de Demouriê Costa Amaral, filho do fazendeiro Antônio Idelfonso da Silva Amaral, conhecido como “Major Amaral”.

Em 1927, Lampião sabia que o Major Amaral era um homem de muitas posses, proprietário de ricas plantações de algodão e gado e que residia no Povoado de Sertãozinho, atualmente município de Major Izidoro, Sertão de Alagoas. Amaral recebeu uma carta ameaçadora do capitão Lampião que queria uma generosa contribuição financeira ao exigir seis contos de réis, uma fortuna à época.

O Major Amaral não estava na ocasião em que a carta chegou, no dia 12 de janeiro de 1927. Quem recebeu a missiva ameaçadora de Lampião foi o filho do Major, Demuriê Costa Amaral, então seminarista que não deixou o “pedido” do cangaceiro sem resposta.

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Flora recusou propostas de pesquisador renomado e não abre mão de ter relíquias: “É um valor inestimável” (Foto: Adailson Calheiros)

“Ele respondeu a carta no mesmo dia que recebeu a primeira correspondência de Lampião”, disse Flora. O tom da carta era ameaçador, conforme alguns trechos da missiva a seguir e registrado pela Tribuna Independente: “Ilustríssimo senhor Major Amaral, suas saudações! (sic)… Lhe faço esta para vosmicê mandar-me seis contos de réis.

Espero e confio que vosmicê não me falte neste ponto. O senhor mandando lhe sairá mais melhor (sic) do que não mandar, porque com certeza eu lhe darei muito prejuízo. Lhe aviso resposta com urgência. Sem mais do seu amigo desejo que venha até cá com o portador, desejo lhe conhecer. Pode vim (sic) sem receio. Nada mal vai lhe acontecer…”

Na resposta de Demuriê no dia 12 de janeiro de 1927, segue: “Amigo Virgolino (sic), recebemos sua carta e digo que não passará privação pois mandei um portador a toda (sic) e vossa senhoria não ficará sem resposta de papai“.

Já Lampião responde novamente: “pode vir sem receio, pois fiquei muito satisfeito com a sua cartinha. Sem mais, Lampeão (sic)”, assina o Rei do Cangaço.

As cartas receberam o certificado de autenticidade e despertaram o interesse até do famoso escritor e historiador Frederico Pernambucano de Mello, ex-superintendente do Instituto de Documentação da Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj) – e que tem obras publicadas como Estrelas de Couro: Uma estética do cangaço e Benjamin Abrahão: entre anjos e cangaceiros. Frederico fez uma tentadora proposta a Flora e família para obter os bilhetes, mas não conseguiu ficar com a relíquia.

“Ele tentou comprar, disse que tinha outras cartas de Lampião com as mesmas letras a essas que temos, mas decidimos não vender porque é uma lembrança inestimável”, revela Flora.

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(Fotos: Adailson Calheiros)

CASOS E CAUSOS SOBRE A FIGURA MÍTICA; JÁ SÃO MAIS DE DOIS MIL LIVROS ESCRITOS

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Família de Lampião em 1926. Ele é o último sentado à direita (Foto: Arquivo)

Herói ou bandido, uma coisa é inquestionável. Virgulino Ferreira, o Lampião, é um dos personagens que mais despertam a curiosidade ao longo da história e da literatura brasileira de todos os tempos. Prova disso é que são mais de dois mil livros que versam sobre a figura emblemática do cangaceiro.

“Tem gente sem nenhuma ou a menor fundamentação ou conhecimento de Lampião e que está falando muita fantasia e, o pior, escrevendo”, opina o pesquisador Jairo Oliveira.

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Lampião criança com nove anos de idade, aos 20, e embaixo, no ano de 1931, com o olho direito após ser atingido por um glaucoma (Fotos: Arquivo)
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“Bandido ou não, marginal ou não, o fato é que Lampião é uma personagem histórica. E vou mais longe, quem estuda Lampião vai, naturalmente, estudar o Sertão, o Nordeste”, opina o pesquisar Jairo Luiz Oliveira, ao ressaltar que nesses 80 anos de morte do Rei do Cangaço a academia e as universidades com seus pesquisadores voltaram a se interessar pelo fenômeno do cangaço, depois de anos e anos a empinar o nariz para o assunto. “O importante é que os fatos relatados sejam comprovados, estudados e que despertem a curiosidade e estimulem as pessoas a desvendar os mistérios e acabem com os mitos sobre o fenômeno Lampião”, ressalta.

CAUSOS HILÁRIOS SOBRE A FIGURA DE LAMPIÃO E O CANGAÇO ATRAVÉS DO TEMPO

A admiração ou o medo provocado pela presença física ou até mesmo pelas histórias e lendas contadas sobre Lampião ainda persistem sob as mais variadas formas, boa parte hilárias. O Rei do Cangaço morreu há 80 anos, mas, mesmo assim, as pessoas, principalmente no Nordeste do país, ainda contam casos e mais causos que viraram mais folclore do que outra coisa sobre o Rei do Cangaço e seu reinado.

Confira alguns:

-> Certa vez, em 1981, durante uma palestra em um colégio particular em São Paulo, o cangaceiro Balão, do bando de Lampião, foi convidado a discursar com estudantes e jornalistas para falar sobre sua vivência na época do cangaço. Lá pelas tantas, empolgado com a audiência efusiva, o ex-cangaceiro saiu-se com esta pérola ao lembrar da batalha mais terrível em que ele e seus companheiros participaram em Pernambuco, e que Lampião comandara. “Olha, matamos tanto policial, tanto policial, que os urubus só comiam de sargento para cima!” …

-> Um sujeito metido a pesquisador e escritor, José Geraldo de Aguiar, sobre a vida de Lampião lá das bandas de Minas Gerais, espalhou aos quatro ventos no início dos anos 2000 que sua obra, um livro, revelaria que Lampião estaria vivo. Pois bem, na sua “obra”, o tal escritor apresentava o suposto Rei do Cangaço com uma anomalia que facilmente foi identificada pouco tempo depois por estudiosos sérios como uma história sem pé nem cabeça. “O Lampião do livro apareceu na fotografia cego do olho esquerdo, quando todos sabem que o verdadeiro Lampião tinha um leucoma no olho direito que depois se agravou por causa dos espinhos. Além disso, o falso Lampião já estaria à época com muito mais de 100 anos”, desmistificou o pesquisador Jairo.

-> O cangaceiro Criança, um dos que escaparam do tiroteio de Angicos, foi requisitar a aposentadoria pelo Funrural em São Paulo muitos anos depois. Para contar o tempo de serviço, dizia ele – olha coloca aí que trabalhei tanto tempo como gari, mais tantos anos como vendedor, depois mais outros tantos anos como pintor… Aí o entrevistador da aposentadoria informa, inocentemente: – Olha, mas o senhor está faltando tantos anos e não dá para o senhor completar seu tempo de serviço agora. Criança saltou de onde estava e informou – Olha, lembrei! Coloca aí que fui cabra de Lampião por oito anos!…

-> Na exposição das cabeças do bando de Lampião em Piranhas nos degraus, ao lado da prefeitura morava o tenente João Bezerra com sua esposa Cira. Antes de decidir colocar as cabeças nas escadarias da prefeitura, Bezerra sugeriu colocar a exposição macabra em frente a sua própria casa, o que foi imediatamente reprovado por sua esposa Cira. “Aqui não, senhor, coloca isso pra lá!”

-> Em outra história lembrada pelo pesquisador João Souza Lima, considerado um dos principais historiadores do cangaço, a população, com medo da fama de violento de Lampião, acreditava em todas as histórias sobre o cangaço. Uma delas foi criada com o objetivo de afugentar os sertanejos que ajudavam a esconder os cangaceiros, os conhecidos coiteiros. As volantes (polícia da época) espalharam que Lampião matava crianças com punhal. Segundo uma das histórias contadas pelos policiais, o cangaceiro jogava as crianças para o alto e as parava com um punhal.

-> Por volta de 1928, o tenente chamado Geminiano, que fazia parte da Força Pública de Segurança de Pernambuco, recebeu um telegrama, informando que o bando de Lampião estava na região de Delmiro Gouveia. Em resposta, Geminiano respondeu o seguinte: — Entendido, perfeitamente! Vou cercar o bando em Arapiraca.

TRIBUNA REFAZ CAMINHOS DO CANGACEIRO EM ALAGOAS ATÉ SEU ÚLTIMO SUSPIRO

Quatro dias de solo a solo a peregrinar pelo Sertão. O intuito? A procura insaciável da equipe da Tribuna Independente em busca de informações sobre a passagem de Lampião pela caatinga alagoana, principalmente fatos novos. E assim foi feito: lá foi a equipe em busca dos caminhos que o Rei do Cangaço trilhou ou pensou trilhar em terras alagoanas. No roteiro, Mata Grande, Santana do Ipanema, Olho d’Água das Flores, Delmiro Gouveia, Água Branca até chegar ao ponto final do périplo, Piranhas, local onde o cangaceiro tombou com parte de seus seguidores no Sertão.

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Local onde foi assassinado o pai de Lampião, em Mata Grande (Foto: Adailson Calheiros)

Mata Grande,
19 de julho de 2018

A reportagem chega ao Povoado Santa Cruz do Deserto, local onde tombou o pacífico e avesso à violência José Ferreira, pai de Virgulino. Em 1920, ele havia mudado para Água Branca, em Alagoas e, posteriormente, para o povoado de Santa Cruz do Deserto, município de Mata Grande, onde sua esposa, Maria, morre de infarto logo na chegada.
Em 26 de julho de 1920, uma volante comandada pelo então sargento Lucena Maranhão, da PM de Alagoas, invade a casa de um suspeito de roubo, entra atirando e mata três pessoas que não ofereceram resistência. Um deles era José Ferreira, que apenas descansava e não tinha ligações  com o procurado da polícia.

“Foi a partir deste episódio do assassinato do pai, que Virgulino avisa que daquela data em diante iria matar até morrer. A partir daí ele dá início oficial à sua vida de cangaceiro assumido. Mas como já se sabe, esta não foi  a razão de ele entrar no cangaço, uma vez que já havia aderido à vida na caatinga”, conta o historiador santanense Clerisvaldo Chagas.

Em Santa Cruz do Deserto uma singela homenagem ao pai do Rei do cangaço, típica dos lugarejos e povoados do Sertão. Uma  placa e uma cruz para lembrar onde tombou o pai de Virgulino.

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Historiadores e escritores santanenses Clerisvaldo B. Chagas e Marcello Fausto (Foto: Adailson Calheiros)

Santana do Ipanema,
20 de julho de 2018

Nesta parada, a Tribuna encontra e conversa com os historiadores e escritores santanenses Clerisvaldo B. Chagas e Marcello Fausto, autores do livro “Lampião em Alagoas”.

“Se você observar, a história e a ligação de Lampião com Alagoas inicia-se e passa, necessariamente, por Santana do Ipanema. O soldado que tirou a vida do pai de Lampião foi o Caiçara, que era um santanense comandado pelo coronel do batalhão, José Lucena Maranhão”, ressalta Fausto.

A outra questão relevante para Santana do Ipanema foi a instalação do 2º Batalhão de Regimento Policial Militar de Alagoas em 1936 que originou as forças volantes em território alagoano com cerca de 120 homens especificamente para caçar cangaceiros.

“Isso ajuda nosso município a crescer do ponto de vista econômico porque todos os outros municípios circunvizinhos viviam amedrontados com o bando de Lampião e esse batalhão ajuda a afastar a ameaça de Lampião a não passar por aqui e, em verdade, ele nunca veio”, acrescenta Chagas.

“Santana era o lugar mais seguro do Sertão de Alagoas e tanto foi assim que as pessoas de outras cidades se mudaram para cá. Com isso, o comércio cresce e Santana se torna o lugar mais desenvolvido do interior por causa desse temor do cangaço. Essa é a benfeitoria e o legado do cangaço porque, de resto, na minha avaliação, Lampião não passava de um bandido”, completa Chagas, ao fazer outra observação: “Outra coisa que eu admirava em Lampião era que ele era um gênio militar, um estrategista”.

Após o massacre em Angico, Santana, onde funciona a atual Escola Cenecista, antes foi a sede do Batalhão e, nos degraus da Igrejinha de Nossa Senhora Assunção, no dia 30 de julho de 1938, sob forte curiosidade da multidão, foram expostas as cabeças de Lampião, Maria Bonita e do resto do bando.

“As cabeças vieram numa lata de querosene e depois providenciado formol”, diz Fausto.

Água Branca, 
20 de julho de 2018

Foi lá que Lampião fez sua primeira ação como chefe de bando. Ao contrário do que muitos historiadores dizem, segundo sustenta o jornalista, não é verdade que ele tenha maltratado a baronesa e ainda desfilado com ela pelas ruas, uma senhora de mais de 80 anos. “Ele roubou o que tinha que roubar, umas joias, e foi embora, não teve nada de desfilar com a senhora. O que dizem sobre isso é tão somente para florear suas histórias em livros”, disse o historiador João Marcos Carvalho.

Olho d’Água das Flores, 
20 de julho de 2018

Angico. O local foi o último suspiro do Rei do Cangaço.

Ao entrar na embarcação que leva à Grota de Angico, na divisa de Alagoas com Sergipe, a sensação e atmosfera são diferentes para a equipe de reportagem. É a primeira vez que os jornalistas da Tribuna vão pisar o solo da caatinga que deu cabo à parte do bando de Lampião. Do Porto de Piranhas, município emblematicamente conhecido como “Cidade das Volantes”, no lado de Alagoas, até a entrada de Angico, no município de Poço Redondo, em Sergipe, são pouco mais de 10 km de catamarã e beleza exuberante. A navegação pelo Velho Chico abre alas para um cenário de morros de paredões rochosos cobertos pela vegetação da caatinga.

Na entrada de Angico até o ponto onde ocorreu o massacre do 28 de julho de 1938, a paisagem muda, é tensa. São pouco mais de 600 metros de caatinga, solo íngreme, com pedras, mato, canto de pássaros e ruídos genuínos da natureza, como se alertassem para que o visitante esteja sempre alerta. Guiados pelo historiador Jaime Luiz Oliveira, depois do percurso, o peregrino confronta-se com a famosa Grota onde se espalharam tantas versões. E lá estão as cruzes, as inscrições, o cenário que até os dias de hoje intrigam tanta gente.

TV EDUCATIVA RETRATA LAMPIÃO EM DOCUMENTÁRIO

Com lançamento previsto para meados de agosto próximo, o documentário “Os Últimos Dias do Rei do Cangaço”, produzido pela TV Educativa de Alagoas, com direção do jornalista e historiador João Marcos Carvalho e imagens de André Feijó, promete acirrar ainda mais a discussão em torno das polêmicas que há oito décadas mantêm acesas as controvérsias em torno da figura de Lampião e das circunstâncias que cercam sua morte na Grota do Angico, em 28/7/38, último covil do chefe cangaceiro e seu bando, que depois da redivisão territorial de 1953, foi desmembrado de Porto da Folha (SE) e incorporado ao município de Poço Redondo, no mesmo estado.

Ao completar 40 anos de pesquisas e investigações históricas sobre o Cangaço, João Marcos adianta para a Tribuna Independente suas conclusões com relação a assuntos que ainda provocam acalorados debates entre os estudiosos do tema.

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(Foto: Arquivo Pessoal)

Tribuna Independente – Num breve resumo, o que foi o Cangaço?

João Marcos – Foi um fenômeno exclusivamente nordestino, produzido em razão de uma elite cruel e excludente que dominava (e ainda domina) vastas áreas da região varridas pelas secas cíclicas, onde o “coronel” sertanejo, como administrador da miséria, é o dono da vida e da morte. Foi nesse cenário de injustiças sociais que surgiu a figura do cangaceiro, representado por centenas de homens e dezenas de mulheres que abandonaram suas vidas de semiescravos, sem perspectivas de ascensão social, para se juntar em grupos nômades armados, que, na busca pelo reconhecimento à valentia, enxergaram na violência uma forma de protesto contra o arbítrio da polícia e da Justiça. Mas é preciso deixar claro que os cangaceiros, que jamais foram politizados, também se aliaram aos “coronéis”, aos quais prestavam serviços como milicianos assalariados.

TI – Descreva a figura de Lampião.

JM – Sertanejo típico, inteligente, controverso, guerrilheiro audaz, articulado, líder incontestável, cumpridor fiel da palavra dada, amado por uns, odiado por outros e assassino implacável, que cometeu atrocidades contra pessoas indefesas e desarmadas.

TI – O bando de Lampião foi envenenado pouco antes do combate fatal em Angico?

JM – Não. É uma tese furada. Lampião tinha muito cuidado com alimentação que consumia. Os coiteiros que levavam suas compras eram obrigados a experimentar a comida antes dele. Desconfiado, fazia o teste da colher de prata, que, em contato com os alimentos, ficava escura se houvesse veneno.

TI – Há quem diga que o tenente João Bezerra, chefe da volante em Piranhas, era amigo de Lampião. Isso é verdade?

JM – Não creio que fosse amigo, mas há evidências, baseado em depoimentos de alguns de seus próprios soldados, que ele teve encontros com Lampião. O “coronel” Antonio José Correia Britto, avô de dona Cira Britto, esposa de Bezerra, era considerado um grande coiteiro de Lampião. Mas não há documentos ou provas cabais de que Bezerra tenha seguido essa trilha.

TI – O aspirante Ferreira de Melo, que integrou a volante de Bezerra no dia da morte de Lampião, era um espião do governo alagoano para vigiar policiais que possivelmente tinham ligações com os cangaceiros?

JM – Tudo indica que sim, já que ele foi designado para uma função para a qual não estava preparado. Não conhecia a caatinga e nunca havia combatido cangaceiros. Nas entrevistas que deu, Ferreira, que como Bezerra chegou a coronel, nunca confessou essa condição de espião, mas sempre deixou insinuações nas entrelinhas.

TI – Por que o sargento Aniceto, membro da volante de Bezerra, e que conhecia a região do Angico com a palma da mão, não conseguiu fechar o cerco na Grota, por onde escaparam 23 cangaceiros durante o tiroteio?

JM – Aniceto era casado com Raimunda, prima de dona Cyra, da Família Britto. Minhas pesquisas apontam que ele não tinha qualquer interesse em pegar Lampião, já que teria negócios comerciais com alguns cangaceiros. Há pesquisadores que acreditam que se o aspirante Ferreira de Melo não tivesse integrado a volante de Bezerra, Lampião teria escapado. É importante lembrar que foi a vanguarda de Ferreira que deu início ao combate, matando Lampião e Maria Bonita. Restou à tropa de Bezerra, que vinha mais atrás, abrir fogo contra o grupo de Zé Sereno.

TI – O que foi feito com as joias de ouro, as pedras preciosas e a grande quantidade de dinheiro recolhida pela volante com os cangaceiros mortos?

JM – O espólio foi dividido entre eles, sendo que a maior parte ficou com Bezerra, que presenteou diversas autoridades. O próprio comandante da volante conta que o então ditador Getúlio Vargas e sua esposa Darci receberam dele um anel e um broche durante homenagem a ele prestada no Palácio do Catete logo após a morte de Lampião.

TI – E quanto às armas e outros objetos?

JM – Uma pequena parte, como cartucheiras, chapéus, lenços, bornais, óculos, fuzis, punhais e pistolas foram doadas ao Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas, em Maceió, onde estão até hoje. O restante ficou com os membros da volante, que os venderam ao longo dos anos.

TI – Além disso, há outras novidades no seu documentário?

JM – Na reconstituição da cena do tiroteio final em Angico, estou usando as três armas originais automáticas que foram utilizadas pela volante naquele dia. Uma submetralhadora Bergmann e duas pistolas metralhadoras que davam rajadas, fundamentais para a vitória da polícia, além de fuzis que estiveram com os cangaceiros.

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Cabeças dos cangaceiros expostas na escadaria da Prefeitura de Piranhas no dia 28 de julho de 1938 (Foto: Joãozinho Retratista / Arquivo)

Fonte: Tribuna Independente / Texto: Wellington Santos e João Marcos Carvalho (jornalista e pesquisador)

FLORO NOVAIS: ESCRITORES SANTANENSES RELANÇARÃO LIVRO
Clerisvaldo B. Chagas, 30 de julho de 2018
Escritor Símbolo do Sertão Alagoano
                                                          Crônica: 1.952                          

                                 

 
Como o segredo já foi revelado, esperamos para o mês de outubro, na Paraíba e Pernambuco, a 2a edição do livro “Floro Novais, herói ou bandido?”. A primeira edição do citado livro aconteceu em 1985, sendo rapidamente esgotada. Pressionado por inúmeros pesquisadores, principalmente da área advocatícia, os autores Clerisvaldo B. Chagas e França Filho, constituíram parceria com o maior livreiro nordestino, Francisco Pereira Lima, visando a 2edição. O livro “Floro Novais, herói ou bandido”, é fruto de documentário realizado com a própria família do “Vingador do Sertão”, da atual cidade de Olivença, Alagoas.  Esta edição será reproduzida na íntegra, com mudança apenas na capa e na apresentação técnica da obra.
Veja o que disse o escritor olhodaguense Antônio Machado, em prefaciar a 1edição. (...) Convictos estamos caros escritores, que o livro FLORO NOVAIS, HERÓI OU BANDIDO? que vocês, oram oferecem ao nosso povo, não será um ópio, mas um apanágio dentro de uma sociedade tão manipulada pelos meios de comunicação de nosso tempo, e onde a Literatura ainda é tão mal difundida. O livro de vocês é realmente digno de elogios, porque além da fidelidade dos fatos, possui uma narrativa acessível e um linguajar “assertanejado” e, indubitavelmente, tornar-se-á um “best-seller” dentro da literatura alagoana e quiçá nordestina (...).
De fato ainda é um “best-seller” em toda a Região Nordeste. O nosso parceiro Francisco pretende lançar o livro no próximo evento do “Cariri Cangaço”, se não me engano, em Pernambuco no próximo mês de outubro. Aqui em Santana do Ipanema, não faremos lançamento. Avisaremos com antecedência pelos meios de comunicação e agendaremos lugar, dia, hora e preço para uma mesa redonda com os que se interessarem em adquirir um exemplar.
Após a era lampiônica, Floro Novais tornou-se a figura lendária de maior relevo em casos de vingança. Foi motivo de reportagem nacional pela Revista o Cruzeiro e, teve um reinado, assim como Lampião, em torno de vinte anos, com inúmeras reportagens no Nordeste sobre suas ações. Como personagem polêmico, só você, caro leitor – após a leitura – poderá dizer se FLORO NOVAIS, FOI HERÓI OU BANDIDO?.
                                                                      

 

Link para essa postagem

http://clerisvaldobchagas.blogspot.com/2018/07/floro-novais-escritores-santanenses.html

Sabedoria popular e racismo em pauta no campus Arapiraca

Discussões da manhã de terça-feira (24) na SBPC Afro e indígena trouxeram os temas para o âmbito acadêmico

↑ Dona Maria de Fátima dividiu com o público suas experiências como mestra de saúde popular (Foto: Assessoria da Universidade Federal de Alagoas)

A manhã do último dia de realização da SBPC Afro e Indígena teve como destaque as discussões em torno da sabedoria popular e do racismo. Dessa forma, o evento trouxe para o espaço acadêmico temas que ainda são pouco explorados e discutidos pelos pesquisadores. As atividades do evento tiveram continuidade durante a tarde, com a professora colombiana Liliana Parra, numa mesa-redonda sobre as práticas intelectuais afro-indígenas na América Latina.

A sabedoria popular no tratamento de saúde

Na oficina Roda de cuidados das mulheres mestres populares em saúde da comunidade de Pau D’Arco, dona Maria de Fátima apresentou ao público suas vivências enquanto mestre de saúde popular, que fabrica remédios a partir de plantas para curar as mais diversas patologias.

Segundo dona Fátima, o saber sobre as propriedades das ervas e raízes curativas é transmitido oralmente entre as moradoras da comunidade do Pau D’Arco, que trocam suas experiências em conversas corriqueiras durante o dia a dia.

Questionada sobre o valor de seu trabalho, dona Fátima garante que o maior deles é a caridade. “Eu sou uma pessoa humilde, mas meu coração é enorme. Se alguém chega até mim sofrendo e não pode pagar, eu vou atender do mesmo jeito e a recompensa vai chegar depois”, explica.

Apesar de se tratar de um conhecimento que não é registrado em documentos, dona Maria de Fátima garante que ele permanecerá nas próximas gerações. “O nosso saber morre com a gente, mas renasce em outras pessoas que aprenderam com os seus antepassados”, conclui.

Relações afetivas e questões étnico-raciais

Comandado por Larissa Virgínia (UPE), Fátima Vieira (Ufal) e Raul Santos (Creas), o minicurso sobre afetividade negra promoveu a troca de experiências entre a mesa e a plateia, que teve a oportunidade de falar sobre suas próprias vivências.

Os integrantes da mesa tocaram em assuntos fundamentais, como o racismo estrutural que perpassa as interações sociais, a homoafetividade de negros e negras, as relações familiares e a necessidade de auto-aceitação. Assim, o campus Arapiraca foi palco de um debate acalorado que estimulou a participação da plateia.

Para Larissa, todos os temas que compuseram o minicurso devem ser pauta não somente no âmbito acadêmico, mas também no dia a dia. “O corpo e os afetos são posicionamentos políticos, por isso não devemos abrir mão deles em momento algum”, comentou.

Para o professor Antônio César (Ufal), que assistiu à atividade, abordar essa problemática dentro da Universidade é essencial. “O debate é importante para compreender de que forma a afetividade se relaciona com o racismo, gênero e diversidade sexual, compreender como ela é construída socialmente”, destacou.

Fonte: Assessoria da Universidade Federal de Alagoas / Texto: Renata Menezes

‘Laços com avós precisam ser reforçados’

Comemoração do Dia dos Avós é importante porque incentiva respeito e demonstração de sentimentos entre avós e netos

↑ 26 de julho é dedicado ao Dia dos Avós; em uma escola particular da capital, data é comemorada com música, cartilha e muitos abraços (Foto: Adailson Calheiros)

Esta quinta-feira (26) é Dia dos Avós. E as comemorações alusivas à data são sempre recheadas de muitas emoções e lágrimas. Mas segundo especialistas cultivar o respeito e o afeto deve ser uma tarefa diária.

O psicólogo Carlos Gonçalves explica que os gestos e mensagens de carinho devem ir além. É preciso incentivar o respeito e inserir aspectos como o companheirismo e a dedicação nos relacionamentos.

“Uma coisa muito saudável e que nós estamos perdendo é a criança, principalmente ela, entender o idoso. Isso está se perdendo muito. A importância do respeito, porque se isso não vai sendo reforçado pelos pais, se perde. As pessoas não estão tendo tempo para sentar e dialogar. Eles merecem respeito e se não cobrar, no bom sentido, vai ficando essas ausências e isso é ruim. Abraçar, falar, perguntar como está, dedicar uns minutos. Mas muitos dos pais nem estão fazendo, e os filhos acabam reproduzindo. Aquela coisa de ouvir histórias, de conversar e o idoso vai ficando de lado”, pontua.

Os benefícios da relação entre avós e netos vão além dos laços familiares. Gonçalves ressalta que pontos como fortalecimento da saúde mental, equilíbrio, melhora da autoestima são ganhos para os dois lados.

“É totalmente saudável e indicada essa relação. Quem tem a sorte, o privilégio de desfrutar a companhia dos mais velhos traz um benefício muito grande para a auto estima, a ansiedade… Recebe um amor que não é o do pai ou da mãe, é ainda mais intenso, sem conflitos, que é o dos avós. Conversar, ouvir histórias. Isso é uma troca de experiências de vida e isto é um benefício para a saúde mental, para o equilíbrio. Quem tem, digo que aproveite, não só no dia dos avós”, afirma.

Para a educadora Valderez Barbosa, as comemorações do dia reforçam os laços e ajudam na integração dos avós com os netos.

“É muito importante ensinar a criança a valorizar os avós. Porque eles envelhecem a acabam ficando esquecidos. Então, os trazemos para a escola para integrar a família. E o contato é maravilhoso, tanto dos avós com os netos, como dos netos para os avós. Nós passamos a semana inteira trabalhando o tema, porque a família se você não cuidar como vai haver sociedade? A família é célula da sociedade. É graças aos avós que os netos estão aqui. É importante cultivar a família”, ressalta.

Músicas e abraços marcam celebrações

 

Em uma escola particular da capital, esta quarta-feira (25) foi dedicado a celebrações. Com músicas, cartinhas e muitos abraços, as crianças demonstraram o amor pelos avós. Dona Nilva Guimarães, de 78 anos foi prestigiar a apresentação dos netos Daniel de 8 anos e Beatriz de 4.

Para ela a relação entre eles é regada por muito carinho. “É um amor, é um entrosamento muito bom. Temos muito respeito uns pelos outros, eu ainda sou das antigas e a formação deles é muito importante para mim”, diz a avó.

Aydée Falcão, de 71 anos, tem três netos, de 15, 10 e 5 anos. Segundo ela, apesar do choque de gerações, respeitar deve ser a prioridade.

“Eu acho uma experiência maravilhosa. Embora as gerações sejam diferentes, eu combato, falo devagarzinho, porque esses meninos de hoje têm que falar devagarzinho, mas é tudo se ajustando. E as apresentações são maravilhosas me enchem de emoção, família é tudo né?”, diz emocionada.

O psicólogo Carlos Gonçalves explica ainda que vários perfis de avós têm surgido. Um deles, é o perfil dos avós cada vez mais participativos.

“Os avós estão se tornando cada vez mais jovens. Não são mais os avós apenas da cadeira de balanço. Eles são ativos, participam ativamente da vida da criança, faz questão de estar presente e quando a criança retribui isso, só temos pontos positivos. A troca de energias é muito positiva”, ressalta.

É o caso de Luzineide Guedes, de 54 anos. Ela é avó de Ian, de 6 anos. A amizade entre os dois é um fato destacado na relação, segundo ela. Mesmo assim o pequeno não escapa da disciplina em certos momentos.

“É ótima né, somos amigos. A gente se dá muito bem, nunca tive problema com ele. Nós brincamos, ele ri. Quando ele se apresenta, assim que chego eu choro, e ele fica rindo. Somos amigos, mas eu também imponho e ele me respeita, respeita a disciplina”, detalha a avó.

Fonte: Tribuna Independente / Evellyn Pimentel

 

 TV E JORNAL ENTREVISTAM ESCRITORES SANTANENSES
Clerisvaldo B. Chagas, 20 de julho de 2018
Escritor Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica: 1.946
JORNALISTAS ENTREVISTAM B. CHAGAS. (FOTO: MARCELO FAUSTO).
 
A população de Santana do Ipanema foi ontem representada pelos escritores Clerisvaldo B. Chagas e Marcelo Fausto em sua historiografia cangaceira. Já no cair da tarde – tendo como palco o Restaurante e Pousada Aquarelas – uma enxurrada de perguntas, por mais de duas horas, crivou a mente dos sertanejos na Távola Retangular daquele estabelecimento. A catapulta veio com satisfação dos jornalistas da Tribuna Independente e TV Cultura Wellington Santos, Adailson Calheiros e João Marcos Carvalho. Os cenários dos anos 20 e 30 foram rastreados na desenvoltura dos jornalistas no cerco aos bandos cangaceiros. Santana do Ipanema surgiu inúmeras vezes como núcleo de forças volantes e sede de batalhão formado para combater o cangaceirismo em Alagoas.
Santana do Ipanema começa a sua notoriedade na luta contra bandidos, a partir da implantação do 20Batalhão de Polícia com sede na cidade. Ocupando a Cadeia Velha e depois o prédio ocioso construído para ser hospital, os soldados tinham como comandante o, então, major José Lucena de Albuquerque Maranhão. Era daquele edifício que saíam as ordens para todas as volantes espalhadas em território alagoano. Dali também saíram as últimas ordens para o aperto final da polícia contra Lampião e seus asseclas. E para quem não sabe, partiu de Santana do Ipanema para o Brasil e para o mundo a primeira notícia da morte de Lampião, Maria Bonita e mais onze congaceiros. A igrejinha/monumento a Nossa Senhora Assunção, recebeu em seus degraus a exposição das onze cabeças dos sequazes trucidados na fazenda Angicos, em Sergipe, por três volantes alagoanas.
Este é apenas um resumo da entrevista à Tribuna Independente e a TV Cultura, diante das argutas indagações dos escolados jornalistas. A história do cangaço na compartimentação Santana do Ipanema é totalmente ignorada pela sua população de hoje, mas, rica em detalhes em nosso livro: Lampião em Alagoas,atualmente, única testemunha daquele tempo tenebroso.
Mas como essa geração pode saber de nada se a história do município não está nos currículos escolares. Enquanto isso o livro “O boi, a bota e a batina, história completa de Santana do Ipanema, continua na gaveta”.
Onde estão os mecenas e as autoridades?
 TV E JORNAL ENTREVISTAM ESCRITORES SANTANENSES
Clerisvaldo B. Chagas, 20 de julho de 2018
Escritor Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica: 1.946
JORNALISTAS ENTREVISTAM B. CHAGAS. (FOTO: MARCELO FAUSTO).
 
A população de Santana do Ipanema foi ontem representada pelos escritores Clerisvaldo B. Chagas e Marcelo Fausto em sua historiografia cangaceira. Já no cair da tarde – tendo como palco o Restaurante e Pousada Aquarelas – uma enxurrada de perguntas, por mais de duas horas, crivou a mente dos sertanejos na Távola Retangular daquele estabelecimento. A catapulta veio com satisfação dos jornalistas da Tribuna Independente e TV Cultura Wellington Santos, Adailson Calheiros e João Marcos Carvalho. Os cenários dos anos 20 e 30 foram rastreados na desenvoltura dos jornalistas no cerco aos bandos cangaceiros. Santana do Ipanema surgiu inúmeras vezes como núcleo de forças volantes e sede de batalhão formado para combater o cangaceirismo em Alagoas.
Santana do Ipanema começa a sua notoriedade na luta contra bandidos, a partir da implantação do 20Batalhão de Polícia com sede na cidade. Ocupando a Cadeia Velha e depois o prédio ocioso construído para ser hospital, os soldados tinham como comandante o, então, major José Lucena de Albuquerque Maranhão. Era daquele edifício que saíam as ordens para todas as volantes espalhadas em território alagoano. Dali também saíram as últimas ordens para o aperto final da polícia contra Lampião e seus asseclas. E para quem não sabe, partiu de Santana do Ipanema para o Brasil e para o mundo a primeira notícia da morte de Lampião, Maria Bonita e mais onze congaceiros. A igrejinha/monumento a Nossa Senhora Assunção, recebeu em seus degraus a exposição das onze cabeças dos sequazes trucidados na fazenda Angicos, em Sergipe, por três volantes alagoanas.
Este é apenas um resumo da entrevista à Tribuna Independente e a TV Cultura, diante das argutas indagações dos escolados jornalistas. A história do cangaço na compartimentação Santana do Ipanema é totalmente ignorada pela sua população de hoje, mas, rica em detalhes em nosso livro: Lampião em Alagoas,atualmente, única testemunha daquele tempo tenebroso.
Mas como essa geração pode saber de nada se a história do município não está nos currículos escolares. Enquanto isso o livro “O boi, a bota e a batina, história completa de Santana do Ipanema, continua na gaveta”.
Onde estão os mecenas e as autoridades?

''Mais negros e mulheres falando de literatura é uma decisão política"

 

Pela segunda vez a jornalista Joselia Aguiar está na curadoria da Festa Literária Nacional de Paraty (Flip). Sob suas mãos, o evento se repaginou em 2017 a partir da maior presença de autoras mulheres e autores negros em relação as edições passadas. Neste ano não será diferente: a porcentagem se mantém, inclusive nos aspectos da presença de editoras de pequenos portes.

Por Mariana Gama Cubas para Carta Capital

João Bertholini
Josélia: "o fato de incluir mais negros e mais mulheres é uma decisão política. Só que é mais político ainda que essas pessoas falem de suas literaturas".Josélia: "o fato de incluir mais negros e mais mulheres é uma decisão política. Só que é mais político ainda que essas pessoas falem de suas literaturas".
As mudanças geraram polêmicas, mas ao final da edição passada foi conclamada pela imprensa, escritores e artistas. "Se você busca mais autores mulheres e mais autores negros você oferece um programa com menos pessoas conhecidas. Porque, em geral, os mais conhecidos são autores brancos", diz Joselia, que concluiu seu doutorado sobre o escritor baiano Jorge Amado.

Levar escritores com esse perfil não era suficiente para a curadora. Mais que ampliar a presença de setores minorizados da sociedade, Joselia conta que a literatura deles é o centro das conversas na mesas. "Os autores tem que ser tratados como autores e não como temas."

Outro ponto que reflete o êxito da curadoria é número de casas parceiras que promoverão encontros e debates com escritores, artistas, além de sociólogos, juristas e economistas: passou de 7 em 2017 para 22 na edição deste ano, que acontece de 25 a 29 de julho. "Alguma coisa mudou na paisagem da Flip", avalia.

Confira abaixo a entrevista de CartaCapital com Joselia Aguiar.

CartaCapital: Qual foi a sua sensação no encerramento da Flip 2017?

Joselia Aguiar: Foi um dos anos em que eu mais aprendi na vida, pelos bastidores, todas as conversas que tive, com muita gente, sobretudo as conversas com interlocutores negros.

Sendo baiana, tendo estudado autores que de alguma maneira trataram de racismo, como o Pierre Verger e o Jorge Amado, e sempre muito interessada nessa questão, eu achava que tinha uma compreensão do problema. Mas essa compreensão passou a ser outra. Passei por uma tomada de consciência em relação a questão racial. Isso foi incrível.

Outro ponto é que terminei com a sensação de ter feito alguma coisa que tinha sido relevante ao aumentar a quantidade de mulheres, de autores negros. E também da maneira como foi feito, a partir da literatura deles. Não eram mesas só sobre a questão negra, a questão feminina... Muita gente já estava fazendo esse tipo de debate.

Eu brincava dizendo que em todos os lugares você via uma mesa sobre empoderamento feminino, que acabava sendo uma espécies de uma “mesa de cota”. Você não via as mulheres distribuídas na programação, conversando sobre todos os assuntos nos eventos. 

Na Flip decidi que as autoras iriam pelas obras, protagonistas tanto quanto os homens. Os autores negros e as autoras negras da mesma maneira. Não uma mesa só de um determinado horário, de um determinado dia, como se o autor fosse um tema. O autor não é um tema.

CC: Acredita que a Flip se popularizou?

JA: Acho que popularizou de uma determinada maneira. Temos mais atores de editoras pequenas na programação principal. Isso fez com que várias editoras independentes se interessassem em ir à Flip nas programações paralelas.

E quando se abre essa pauta de mulheres e negros na programação, ela também traz grupos que não estavam tradicionalmente incorporados à Flip. Se pensarmos que vamos ter uma casa parceira chamada “Diálogos Insubmissos”, que é organizada por uma pessoa das Letras da Bahia, uma produtora negra, que vai reunir uma programação toda de autoras negras em torno da Conceição Evaristo, é uma coisa que antes não tinha.

Abrindo para mais mulheres e mais autores negros, você acaba trazendo, incorporando, atraindo setores que antes não se sentiam contemplados e com isso vem os leitores também. Quem está buscando essas pautas também se sente incluído. Alguma coisa mudou na paisagem da Flip.

CC: Hilda Hilst é a homenageada deste ano. Qual sua relação com a literatura dela?

JA: Eu era estudante em Salvador quando saiu O Caderno Rosa do Lori Lamby e tive contato com as primeiras notícias dela. Fiquei curiosa para saber que outros livros eram aqueles que haviam sido publicados e sobre mulher que eu nunca tinha ouvido.

Procurei nas livrarias de Salvador e realmente não encontrei. Então ficou um pensamento de que havia “um mundo que eu não conheço e que não está no meu alcance”.

Anos mais tarde, já em São Paulo e como editora da EntreLivros, a Globo lançou a obra da Hilda organizada por Alcir Pécora e comecei a receber a obra da Hilda. Agora é que a obra dela está circulando.

CC: Como foi o processo de escolha da Hilda como homenageada? 

JA: Depois que terminou a Flip do Lima Barreto e a organização me convidou para voltar eu coloquei um ponto meu de que precisava fazer a curadoria de uma autora mulher. E a ideia de ter uma mulher como a Hilda, nesse momento pós Lima Barreto, pareceu boa para os organizadores da festa. 

Assim como o Jorge Amado, ela trabalha a dimensão mística e erótica, mas de maneiras totalmente diferentes. Eu gosto muito dessa coisa de eles se recolherem para escrever. Ela tem a Casa do Sol, ele tem a Casa do Rio Vermelho, ambos acordavam cedo para escrever.

CC: Você diz que Flip gira em torno do literário. O que entende sobre o literário?

JA: Alguns programas em festas literárias incorporam debates de política, de economia, internacional. É possível você ver em uma festa literária um debate sobre Oriente Médio, sobre assuntos de sociologia, a superexposição dos indivíduos nas redes sociais… Isso não está errado. É uma escolha, uma opção, uma forma de desenhar o programa.

Tanto ano passado como este ano decidi não fazer desse modo, acho que as pessoas tem receio de colocar literatura em uma festa literária. Elas acham que as pessoas não vão ser atraídas. Quase que como se quanto mais o debate for de atualidades, mais vai ter pauta e audiência.

Eu quis fazer o contrário, quis pegar a literatura que seria uma coisa que está desaparecendo dos cadernos de cultura. O que leva um jornal a acabar com seu suplemento literário e transformá-lo em um caderno de variedades? A ideia de que não ter leitor para isso e que, se colocar outros temas e outras áreas haverá mais.

Para atrair audiências às vezes as pessoas investem em debates de atualidades e o que quis fazer foi justamente reforçar a literatura e as artes. Todas as mesas, com pequenas exceções, são de escritores falando do seus livros. A literatura está no centro por isso. A gente não pode tirar a literatura de uma festa literária. 

CC: Por isso optou por não chamar profissionais da economia, política ou judiciário?

JA: Queria colocar a literatura em primeiro lugar. Tem muita gente fazendo debate sobre esse temas e quis resguardar, seria uma resistência mesmo. A Flip do ano passado foi de temperatura altamente política. Todas as mesas têm autores que enfrentam temas extremamente graves.

Este ano temos uma homenageada que fez livro pornográfico e, na obra dela, há o que questionamento dos limites. Vamos mostrar que a arte tem que falar de liberdade, de sexo, de religião.

Temos vários autores que falam de religião quando o que está acontecendo no Brasil é um movimento de impedir as pessoas de terem liberdade religiosa. As religiões afro-brasileiras estão sendo atacadas. Vamos homenagear a editora Corrupio, que publicou um autor que escreveu um livro que chama Orixás, sobre deuses africanos no Brasil.

Temos uma mesa que chama Interdito e trata do momento que estamos asfixiado com a ideia de que não podemos falar de certos temas, um autor que fala o que é ser judeu. Esse mesmo autor escreve sobre homoafeto. Há também uma autora que escreve sobre sexualidade entre mulheres no Oriente Médio. São autores que enfrentam com muita liberdade temas tabus.

Do ponto de vista de composição de autores, o fato de incluir mais negros e mais mulheres é uma decisão política. Só que é mais político ainda que essas pessoas falem de suas literaturas. A crítica de que não há debates sobre a atualidade está muito relacionadas ao pessoal que está na grande imprensa, que funciona às vezes no automático. Que é o mesmo automático que diz que a Flip do ano passado era sobre o racismo.

CC: Tanto nesta edição como na anterior você tem priorizado um programa com mais autores de editoras de pequeno porte. Algum motivo especial?

JA: Existe um conceito já conhecido de bibliodiversidade, você consegue uma multiplicidade de olhares, de abordagens sobre muitas questões conforme você tem um leque maior de editoras participando.

Então essa decisão é para democratizar o acesso de editores de menor porte para o grande palco que é a Flip. Foi um dos gestos que contribuiu para deixar a Flip mais diversa sem, necessariamente, passar pela outra etapa que é de ter mais mulheres e mais autores e autoras negras.

CC: Essa decisão desagradou as grandes editoras?

JA: Não chegou a mim em forma de desagrado. Todos os editores querem, claro, colocar seu autores. E como são, obviamente, apaixonados pelos autores e livros que publicam querem muito, insistem. Isso é bem comum. E editores pequenos também são apaixonados pelos seus livros e querem muito.

Então o esforço para serem representados é grande e infelizmente a gente tem um espaço limitado e não consegue contemplar todas as sugestões. O que sinto também é que há um agrado muito grande de editoras menores que passaram a participar da Flip.

CC: O que você não quis repetir nesta edição da Flip em relação a anterior?

JA: Pelo meu jeito de trabalhar não gosto de fazer nada igual ao que fiz. Eu mantive esse programa plural e a literatura no centro por uma busca de maior complexidade dos debates, sem deixar de fora a questão política e social. Mas nesta edição eu tinha um outro tipo de autor para trabalhar.

Enquanto o Lima Barreto lidava diretamente com as questões sociais e políticas - ele tratou do racismo e do Brasil na Primeira República em sua obra -, a Hilda possibilitou fazer uma Flip com grandes temas: o amor, a morte, o sexo, a transcendência, Deus, a ideia de Deus. Era muito interessante ter esse programa plural com esse tipo de debate. Até para que a gente confirmasse que os autores têm que ser tratados como autores e não como temas

Confira a entrevista em vídeo com Josélia Aguiar:

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