O Pintassilgo Aquilino e o Bode Condottiere
Outras Peças LiteráriasFernando Soares Campos 07/09/2025 - 22h 39min
(Afábula que Esopo não perdeu nada por não tê-la escrito)
Um Pintassilgo alçou voo de seu ninho na copa de uma catingueira com o propósito de emigrar do Nordeste para o Sul do Reino Unido do Pau-Brasilis, em busca de farinha, xerém ou, com muita sorte, alpiste — todos escassos devido à seca que castigava sua região de origem.
Chegando à maior cidade do país, uma das maiores do mundo, o Pintassilgo notou que os pardais locais haviam se adaptado aos costumes da vida urbana e conseguiam sobreviver, embora empregando artifícios pouco convencionais para sua espécie.
No princípio, o Pintassilgo de arribação decidiu se comportar como os pardais urbanos, fazendo malabarismo nos faróis de trânsito, capturando insetos e catando migalhas de pão que escapavam dos olhares e bicos dos espertos pardais.
Certo dia, o Pintassilgo pegou carona numa corrente de ar poluído e foi parar numa cidade portuária no litoral daquele mesmo estado. Foi lá que ele, sem querer, comeu uma isca de polvo jogada à entrada de um restaurante especializado em frutos do mar. O polvo estava estragado, mas, sabe-se lá por que cargas d’água, o alimento provocou uma reação no seu organismo, gerando um fenômeno nunca antes detectado pela ciência. Deu-se então um processo metamórfico, e o raquítico Pintassilgo retirante da seca se transformou numa águia.
A few years later... ou, como diria Machado, Alguns anos mais tarde…
Naquela ocasião, a fauna do Reino Unido do Pau-Brasilis estava sendo liderada por um Bode Condottiere, espécie originária de Nitroglicerina Dourada. Porém, na verdade das ilusões, aquele animal bizarro não passava de uma mera Borboleta Peçonhenta.O Pintassilgo, agora transformado em Águia, tornou-se líder dos pardais e, encabeçando movimento revolucionário nunca antes exitoso naquele país, defenestrou o Bode Condottiere e assumiu os destinos de todo o bioma catingueiro.
O aventureiro Bode Condottiere havia deixado a nação nordestina no mais lamentável estado de penúria, nunca antes registrado pela História, submisso aos ditames da FMI (Fauna Mamífera Internacional) e empobrecido pela pilhagem a que os comparsas autóctones se aventuraram durante muitos anos, saqueando os ninhos das espécies mais desprotegidas e vendendo quase todo o patrimônio do Reino a preço de banana-d’água em fim de feira, a hora da xepa.
Durante sua liderança geral, o Pintassilgo Aquilino havia conseguido resgatar da miséria boa parte dos pardais, até prometera construir um milhão de novos e dignos ninhos, onde eles pudessem se reproduzir e criar seus filhotes com dignidade.
O invejoso Bode Condottiere foi relegado ao ostracismo a que os líderes corruptos devem ser abandonados, sem prejuízo das ações penais às quais as leis da natureza pudessem submetê-los. Porém... eis que o empalhado Bode Condottiere sai de sua alcova e, com a ajuda de um bando de urubus malandros, investe em revoada contra a liderança democrática do Pintassilgo Aquilino.
Contudo, por onde o Bode Condottiere passava, toda a fauna se manifestava em retumbante protesto:
– Pipipipipi... Pirata! – piavam os pardais.
– Corru... corru... corru... Corrupto! – arrulhavam os pombos.
...
Moral da história nunca antes moralizada:
Quem tem telhado de vidro pode até jogar titica nos outros; mas pedra, jamais!
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Fernando Soares Campos é psicanalista e escritor, autor de Adeildo Nepomuceno Marques – Um carismático líder sertanejo, em parceria com seu irmão Sérgio Soares de Campos. Fernando também assina três outros livros de autoria solo: Deus e o Universo Holográfico é o mais recente, publicado pela Editora SWA, Santana do Ipanema-AL.



